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domingo, 22 de março de 2009

A Trajetória de um Pioneiro.


A Trajetória de um Pioneiro
Crônica de Lindáurea

José Thomaz Filho, oriundo de Passa Quatro, chegou à Campanha pelo trem, no qual trabalhava, na época em que a Maria Fumaça fazia seu percurso por esta cidade, na década de 1930. Era garçom da Ferrovia e contava com orgulho suas peripécias pelo vagão-restaurante.
Neste vaivém, veio a conhecer minha mãe, Alice Pinto de Almeida, filha do luthier Adolpho Pinto de Almeida, com a qual constituiu matrimônio. Assim, passou a residir nesta terra por mais de 50 anos e já se considerava campanhense.
Iniciou sua vida em Campanha como chofer de praça, como se dizia. Hoje, motorista de táxi. Época em que poucos carros rodavam no Brasil. Tinha um fordzinho preto, no qual fazia corridas não só com as pessoas desta cidade, como também com os turistas que vinham veranear em Cambuquira.
Assim foi seguindo sua estrada, com sacrifícios e muito esforço. Criou uma linha de Campanha para Monsenhor Paulo, na época, conduzida por jardineira. Mais tarde fundou a linha "Rápido São Jorge", de Campanha a Varginha, via Cambuquira e Três Corações, estendendo posteriormente a Monsenhor Paulo.
Ao sentir a necessidade dos campanhenses de irem a Belo Horizonte para resolverem seus problemas de saúde e negócios, que muitas das vezes, só acontecia nesta, ele estudou a possibilidade de fundar uma linha nascendo em Campanha e ir até a capital mineira, via Cambuquira e Três Corações, mais tarde São Gonçalo. Estava estabelecido o novo trajeto do "Rápido São Jorge". Campanha tinha agora, o contato direto a Belo Horizonte, saindo às 5 horas, chegando a capital mineira às 11 horas. Regressando da capital às 14 horas e retornando a Campanha às 20 horas, o que facilitava, em muito, a vida daqueles que queriam resolver seus negócios e ainda regressarem no mesmo dia.
Era um progresso para a cidade. Meu pai considerava-se o "Pioneiro da Campanha", pois com as dificuldades da época ele se sentia um desbravador. Talvez muitos não saibam, que em nossa terra já houve essa comunicação direta a capital do Estado; por isso, eu reforço que ele fez parte da história da Campanha. Bom lembrar que neste período para ir a Belo Horizonte levava em média dois dias, pois tinha de fazer baldeação em outra cidade. Quando as pessoas tinham urgência iam de táxi.
Como pessoa era muito brincalhão, gozador e tinha ditado para tudo. Não deixava passar nada. Transcrevo muito dos ditados usados e, às vezes, criado por ele e que encaixava de cheio quando comentava:

"Quem fala muito, dá Bom Dia a cavalo".
"Viola é na mão de violeiro, sanfona é na mão de sanfoneiro".
"Comigo quanto mais o burro pula, mais eu meto a espora".
"Comigo é assim, com meus parentes eu não sei".
"Pegou fogo no mato". Referia-se às pessoas que falavam demais.
"Debaixo deste angu tem carne”.
"Rádio, relógio, revólver e mulher têm que ser novo”.
"Dois sacos vazios não param em pé”.
"Festa de jacu, urubu não vai".

Na época, em que estava sendo muito utilizado o jargão "primo" ele adorava brincar com as crianças fazendo a pergunta, com dupla interpretação:
- Esse cachorro é teu primo? Em vez de: Esse cachorro é teu, primo? As crianças ficavam sem entender nada. Ele achava uma graça.
Num belo dia, ele resolveu perguntar que cidade era essa? (Referindo-se à Campanha). As crianças logo respondiam que era Campanha, pensando que ele não sabia ou coisa igual. Mas desta vez, ele encontrou um que respondeu que era Barbacena, chamando-o de louco. Ele adorou. Então, ele passou a perguntar se Campanha era Barbacena. Para tudo ele dava um jeito.
No período, em que foi proprietário do "Bar e Restaurante San Remo" e que o mesmo ficava às moscas, muito vazio, ele para não deixar por menos ficava falando:
- Mais que freguesia! Isto era motivo de graça, para aqueles que por lá passavam.
Já na velhice, comentava que o governo pagava para ele dormir. Com isso, ele dormia até tarde. De vez em quando, batiam aqueles viajantes insistentes à porta ele levantava muito invocado e perguntava:
-Tem cobertor de orelha, para vender? A pessoa ia embora sem graça.
Como pai, era o verdadeiro “pai mineiro”: severo, exigente e ao mesmo tempo carinhoso e preocupado.
Concluindo, meu pai foi um lutador que amou Campanha e por esse motivo, em seu túmulo mandei colocar o epitáfio: “Pioneiro da Campanha", como ele mesmo se considerava. Faleceu em 14 de novembro de 1991, com 75 anos, deixando como filhos: Lubélia, Lindáurea, Lourival, Laudemir, Lenildo e Lindbergh.

Texto enviado por Angélica Andrès e de autoria de Lindáurea (filha)

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